As fronteiras que durante muito tempo distinguiram as disciplinas deixaram de ser interiorizadas como limites estáveis e obrigatórios , mesmo quando os artistas não procuram subvertê-las . Os artistas têm hoje ao seu dispor todo o tipo de suportes , materiais e técnicas , sem excluir aqueles que a tradição consagrou , e usam nos com grande liberdade . é certo que muitos continuam a trabalhar dentro de parâmetros disciplinares mais ou menos estáveis .
Contudo , mesmo quando joga o jogo da disciplinas , a arte contemporânea é , por fatalidade histórica , indisciplinada . Os artistas já não se regem por regras e convenções ditadas pela tradição , desarticulada ao longo de um século de rupturas e inovação ; utilizam a tradição com o conhecimento dos modos como ela foi sucessivamente reinventada ou subvertida .
O leque de artistas apresentados na exposição , pertencentes a diferentes gerações , confirma a importância do desenho no contexto das práticas artísticas contemporâneas e contempla uma grande diversidade de usos , desde o desenho como desenho até ao desenho como elemento constituinte ou princípio estruturante de obras que não se deixam classificar como tal . Embora tomando como fio condutor a redefinição do desenho à luz de práticas artísticas actuais , a exposição também dá a ver o desenho , em sentido estrito , como lugar renovado de inquietação , invenção e inovação . Individualmente , e no seu conjunto , os artistas apresentados afirmam as potencialidades criativas e a vitalidade do desenho numa época em que as disciplinas perderam o sentido normativo e disciplinador que assumiram no passado .
Ao longo do século XX , e muito especialmente desde os anos 60 , as concepções e os usos do desenho passaram por transformações radicais . Antes de aflorarmos algumas dessas transformações , e a expansão das fronteiras do que hoje se entende por desenho , importa referir duas mudanças fundamentais que , neste século , afectaram positivamente o estatuto da disciplina : em primeiro lugar , a conquista definitiva de autonomia , isto é , a existência do desenho como obra independente não subordinada a outras disciplinas ; em segundo lugar , a conquista de um estatuto não inferior ao de outras disciplinas . Qualquer uma destas mudanças determina o olhar que hoje podemos ter sobre o desenho .
Considerado durante muito tempo uma arte menor , só neste século o desenho se libertou de um estatuto inferior relativamente à pintura e à escultura . Este estatuto de menoridade estava em consonância com o papel auxiliar que era o seu no processo de concepção e realização das obras naquelas disciplinas .
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